terça-feira, abril 22, 2014

O comércio eletrónico: fim da Geografia?

Já sabemos que os transportes, as vias de comunicação, as qualificações da mão-de-obra, a proximidade às matérias-primas ou preferência pela periferia dos centros urbanos são determinantes fundamentais na localização do tecido industrial. As empresas que prestam serviços têm as mesmas preocupações de localização das unidades produtivas industriais, que devido à natureza específica dos serviços procuram locais mais centrais, garantindo volumes mínimos de procura, de boas acessibilidades. Mas o que dizer do ascender do comércio eletrónico, alguns autores designando de “Nova Economia”? As regras do mundo real não são válidas nas iniciativas do mundo virtual.
Na esférica económica, a internet tem vindo a alterar as formas tradicionais de relacionamento entre os compradores e os vendedores, oferecendo-se novos modelos de compra, de venda e de fornecimento de serviços aos clientes. Tornou-se num instrumento revolucionário na forma como as empresas anunciam, negociam, administram e tratam os seus clientes, em suma, a internet tornou-se um mercado promissor. Segundo o Eurostat, o comércio eletrónico é entendido como “a transação de bens e serviços entre computadores mediados por redes informáticas, sendo que o pagamento ou entrega dos produtos transacionados não terá que ser, necessariamente, feito através dessas redes”. Ainda dentro do comércio eletrónico é possível subdividi-lo em seis tipos básicos, sendo o B2C (Business to Consumer) o tipo de comércio eletrónico aqui em destaque. Este distingue-se pelo estabelecimento de relações comerciais eletrónicas entre a empresa e o consumidor final que se tem desenvolvido bastante devido ao advento da web, existindo já várias lojas virtuais e centros comerciais na internet que comercializam todo o tipo de bens de consumo.
Para além das várias empresas que já disponibilizam os seus produtos em sites de venda, são também vários os casos de pessoas a criar o seu próprio negócio que, quer por opção ou falta de capital para investir num estabelecimento físico, optam cada vez mais por uma loja virtual devido à simplicidade do processo, à fácil e barata gestão comparando a uma loja física, e ao próprio conforto de poder trabalhar em casa. Para agilizar o processo operacional principal (como o cliente será atendido até à entrega do produto ou serviço) o lojista pode ainda criar parcerias com os fornecedores, e nestes casos, o dono da loja realiza todo o processo de divulgação, atendimento e venda e assim que a venda for realizada comunica o fornecedor que faz o facturamento e o envio da mercadoria diretamente para o cliente.
Com esta possibilidade de se realizar pesquisas de preços, compras, fazer serviços de banco ou burocráticos sem ter que sair de casa a qualquer hora do dia, nasceu uma nova tendência no comportamento da sociedade em valorizar coisas práticas, cômodas e que não envolvam muito do seu tempo, o que explica o crescimento e a consolidação deste setor. Mesmo em Portugal, segundo o Barómetro Trimestral do Comércio Eletrónico em Portugal relativo ao segundo trimestre de 2013, 71% dos sites afirmou ter aumentado o volume de vendas no em comparação com o período homólogo e 65% dos sites afirmou ter registado um aumento do número de clientes.
Mas, e para não aqui tomar nenhum lado, não “há bela sem senão” e o comércio eletrónico também apresenta desvantagens: é fortemente dependente das tecnologias da informação e da comunicação (TIC); há uma perda de privacidade dos utilizadores, de identidade cultural e económica das regiões e dos países; não permite a experimentação dos produtos antes da compra e ainda pode ser considerado inseguro. Estes dois últimos são os principais motivos de várias pessoas ainda se mostrarem céticas.
Estamos perante uma nova infraestrutura no comércio - um ambiente de computadores em rede de empresas e famílias – uma nova forma de participação dos indivíduos no processo de trabalho e uma modificação dos limites físicos do local, isto é, esta rede tem esse diferencial que rompe os limites do ambiente físico. Ao contrário de um escritório ou uma loja que tem um horário de funcionamento, a loja virtual está acessível 24 horas por dia, 365 dias por ano, deixando o mercado de ser local para ser visto por milhões de pessoas em todo o mundo. O espaço deixou assim de ser uma barreira, daí ter sido muito badalado o “fim da geografia” a partir do século XXI.
Apesar de não existirem soluções mágicas para reverter a crise económica instalada, o comércio precisa de se adaptar às novas exigências dos consumidores. A qualidade do atendimento, a excelência dos produtos, um espaço comercial renovado e uma aposta na promoção e no marketing, são alguns passos para se conquistar clientes. Como afirmou Lavoisier, “no mundo nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”, porém podemos acrescentar que as transformações são cada vez mais rápidas. O espaço está reconfigurado, não tem o mesmo nível de tratamento nas análises económicas e existe cada vez menos a perceção da distância, das diferenças políticas, culturais ou sociais. Mas, mesmo com o desenvolvimento das tecnologias comunicacionais, com o aumento do uso do computador e o aperfeiçoamento das redes de comunicação, a proximidade geográfica ainda é de suma importância para determinadas atividades, depreendendo-se que a inovação das tecnologias de comunicação e a necessidade do contato direto, na verdade, se completam.

Valérie Rodrigues

(artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular "Economia e Política Regional" do Mestrado em Geografia, do ICS/UMinho) 

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