quarta-feira, outubro 26, 2011

O futuro incerto dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo

Os Estaleiros Navais de Viana do Castelo – ENVC foram criados em Junho de 1944, por incentivo do Governo, com vista ao desenvolvimento e modernização da frota de pesca portuguesa de longo curso. Em 1975, os estaleiros foram nacionalizados, passando a ser uma empresa pública mas, já em 1991 são transformados em sociedade anónima, embora mantendo-se o Estado como o seu principal accionista, actualmente de capitais maioritariamente públicos, vocacionada para a construção e reparação naval. Encontra-se localizada na área portuária da cidade de Viana do Castelo, na costa Atlântica do norte de Portugal. Ocupam uma área de 270.000 m2 e empregam aproximadamente 700 trabalhadores, sendo o maior estaleiro de construção naval de Portugal e já um dos maiores da face ocidental da Europa. Os ENVC começaram pois por se dedicar essencialmente à construção de navios de pesca de longo curso e, só posteriormente, o seu leque de construções se foi alargando para navios de outro tipo.
A crise financeira actual tem vindo a reflectir-se nas mais diversas áreas e os ENVC não foram excepção. Em inícios do corrente ano fomos surpreendidos com manchetes em praticamente todos os jornais bem como na televisão que nos davam conta das dívidas acumuladas da empresa, um valor de aproximadamente 240 milhões de euros, além de que a única actividade se prendia à produção de navios de classe Viana do Castelo – classe de navios-patrulha oceânicos (NPO), resultante do projecto NPO 2000, a ser construída pelos ENVC para a Marinha Portuguesa decorrente de um contrato de 500 milhões de euros para a construção, ao longo de cinco anos, de seis NPO, navios especialmente vocacionados para actuar nas águas alterosas do Atlântico Norte. A entrega do primeiro navio foi realizada em 2010 após um atraso de 5 anos.
Perante a grave situação em que a empresa se encontra, o governo elabora um Plano de Reestruturação e Viabilização dos estaleiros, que prevê uma injecção de capital do Estado de 13 milhões de euros. Segundo Aguiar Branco, “tudo está a ser feito para salvar a empresa”, no entanto a administração garantiu que irá tentar uma “solução negociada” com 380 trabalhadores dos 720 actuais, mas admitiu, em último recurso, avançar para o despedimento colectivo. O passivo da empresa é superior a 200 milhões de euros e, em 2010, as contas fecharam com um prejuízo de 40 milhões de euros e com capitais próprios negativos de 70 milhões.
O coordenador da União de Sindicatos de Viana do Castelo afirmou que estes despedimentos “irão abrir caminho à privatização” bem como prevê dias de “grande agitação social” porque “os trabalhadores não irão ficar de braços cruzados” a assistir à destruição de uma empresa-âncora no distrito e no país. Já José Maria Costa, presidente da câmara municipal de Viana do Castelo, alerta para a grave crise que vai atingir Viana quando forem despedidos os 380 funcionários. “Espero que haja bom senso numa empresa importante para a vida da cidade”, afirma o autarca.
O grande problema a que hoje assistimos na empresa resulta de um acumular de más decisões resultantes de uma gestão ruinosa que “vai de vento em popa”. Reinam as mordomias e os velhos hábitos dos funcionários numa entidade em que já não há sequer dinheiro para comprar papel higiénico e a quem a Galp cortou o fornecimento de gás por falta de pagamento. No entanto, os maus costumes ainda permanecem, na cantina existem cerca de 16 senhoras para servir à mesa bem como um leque de benefícios sociais entre os quais o direito adquirido de 37 horas semanais, com o grosso do pessoal a sair às 16h 30min. Situação esta que obriga por vezes a subcontratar serviços que poderiam ser feitos pelos quadros da empresa. O rol de absurdos e extravagâncias é grande, como o de um desenhador de navios que vem todas as segundas-feiras de Lisboa, em primeira classe, tem motorista dos estaleiros à espera para o conduzir, fica instalado num hotel, e regressa todas as quintas, isto apesar de não ter nada para desenhar.
Recentemente ouviu-se falar na venda do ferry “Atlântida” à Venezuela, acordo este que continua num impasse mas que se prevê a venda por 42,5 milhões de euros. Este ferry resulta de uma rescisão de contrato entre a ENVC e o Governo Regional dos Açores por incumprimento de prazos e requisitos técnicos, e que terá sérios impactes na actividade da empresa que já se encontra em “mãos de lençóis”, além de que terão de devolver os mais de 31 milhões de euros que o governo açoriano já tinha pago pelo navio em causa. Mais, foram gastos 130 mil euros para uma viagem do “Atlântida” entre Viana do Castelo e Lisboa com vista a experimentar o potencial do navio.
A privatização tem sido uma das opções disponíveis na mesa e discutidas. Sabe-se que existem investidores russos interessados na compra dos ENVC, assim como Lula da Silva já afirmou que os estaleiros de Viana do Castelo poderão vir a ser muito importantes para uma cooperação entre Portugal e Brasil com vista ao desenvolvimento da indústria naval brasileira. Não considero que a privatização seja de todo a melhor opção para salvar esta empresa uma vez que somos um país com uma enorme área de costa Atlântica, e sendo esta a maior empresa no sector em Portugal é de extrema importância conseguir reestruturá-la e reabilitá-la de forma a tirar o maior proveito da zona onde nos situamos e do potencial que temos. Além de que é um importante marco na actividade económica da cidade de Viana do Castelo bem como na de Portugal.

Catarina Fernandes

[Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Regional” do 3º ano do curso de Economia da EEG/UMinho]

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